Como se viu na cerimônia de posse do novo ministro da saúde, em Brasília, quem está no poder muitas vezes não tem noção de ridículo
Estamos em meio a uma assustadora e brutal pandemia, que tem deixado um rastro de morte no ar e levado muitos sistemas de saúde em todo o mundo ao colapso. O pior é que ainda sabemos pouco sobre este cataclismo que se abateu sobre nós; por isso, enquanto em todos os cantos do planeta desenvolve-se uma busca frenética por mais conhecimento e soluções, a orientação que prevalece no momento é prevenir a escalada da doença com medidas de distanciamento social.
No entanto, em Brasília – nunca é demais repetir: em meio a uma assustadora e brutal pandemia, contra a qual a única contenção conhecida até o momento é o distanciamento social –, demite-se o ministro da saúde por razões que desafiam a própria razão, como, por exemplo, cumprir muito bem seu papel de coordenar o planejamento e a execução das defesas possíveis no combate ao inimigo invisível.
Como se não fosse suficiente, faz-se um cerimônia de posse – em meio a uma pandemia, não esqueçamos – para o novo ministro, com direito a não utilização de máscara, aglomerações, conversas “ao pé do ouvido”, cumprimentos efusivos e reiterados, discursos vazios, mas cheios de perdigotos lançados sobre a plateia. Estamos em meio a uma pandemia, esqueceram?
Eu, que saí (a única saída desta semana) ainda agora para as compras no supermercado toda paramentada, de máscara e luvas, mantendo distâncias adequadas no trajeto e no local; usando álcool em gel tanto na ida, para pegar o carrinho e fazer o pagamento (antes e depois), quanto na volta, para limpar mantimentos, maçanetas e chave da porta; deixando os sapatos do lado de fora; ficando nua (ou quase) na lavanderia, para deixar a roupa usada tomando um ar, e lavando as mãos com água e sabão entre uma tarefa e outra, fiquei perplexa.
Lembrei daquele episódio de nossa história, em 9 de novembro de 1889, quando o imperador dom Pedro II promoveu um suntuoso baile na Ilha Fiscal, Rio de Janeiro, a então capital imperial, por variadas razões oficiais, mas com o intuito de provar, de acordo com historiadores, que a monarquia estava mais forte do que nunca. Seis dias depois, no entanto, com a proclamação da República, o Império do Brasil chegava ao fim.
O ponto comum entre os dois fatos reside na ilusão, no que se quer acreditar, apesar de a realidade mostrar o contrário. No século XIX, o imperador e seu entorno não perceberam que a monarquia não mais se sustentava e deram uma festa para mostrar que tudo estava bem. No século XXI, o presidente e seu entorno não percebem que o mundo, conforme o conhecemos, está soçobrando e continuam pensando em manter tudo como estava, como se isso fosse possível. Seria ridículo, não fosse tão trágico!
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